terça-feira, dezembro 30, 2008

Sólo un segundo

Por Bacilos


"La recuerdo sin azúcar y sin crema y sin excusas

La recuerdo en la mañana despertándose en mi cama

La recuerdo en la pereza de una rutina que empieza

La recuerdo preocupada por lo que hoy no vale nada


La recuerdo en sus dilemas entre cuentas y poemas

En el ruido de la calle perdida siempre en los detalles

La recuerdo, sin vergüenza

La recuerdo en un segundo en que llego a lo mas profundo"

terça-feira, dezembro 23, 2008

Belém:

açaí
sorvete de pavê de cupuaçu, paraense, mestiço
açaí
maniçoba
farofa
batata palha
acaí com gelo, açúcar e farinha de tapioca

e alguns quilos a mais.
de melzinha a melancia.

Amizade velha de momentos novos

Casa nova na Cidade Velha.

Fachada laranja, corredor comprido
- com janelas nos quartos, que dão para dentro da casa. Na ordem desorganizada Juana, Júlia, Thaís e a amiga do pacto de cuspe - Tia Luísa.
Roger e Tininha - os bichinhos - não têm quarto. Ou melhor, têm todos, entre janelas e ventiladores. Calcinhas, brincos e sutiãs.

As vozes se confundem, as mulheres também.
É tudo igual, problemas, confusões e a amizade.

Dois anos de contexto relatados.
Quatro horas e um pouco da madrugada: mal dão pro começo de uma grande saudade.
Maravilha de risoto!

quarta-feira, dezembro 10, 2008

Tropeços

Casamento do tio em Búzios, coisas da burguesia.

Família em processo de separação, "é importante estarmos juntos nessas horas", diz a avó por parte de madrasta, "eu e seu avô fizemos as contas e dá pra comprar sua passagem, você vem né? A gente entende se tiver muito ocupada, mas nós queremos muito que você venha", insiste.

Então eu vou, saio na sexta pra voltar terça. Pego um frescão direto pra Copacabana. Maravilha de transporte público, ah se Brasília tivesse um desses. E sigo curtindo o Ipod enquanto passam à minha frente favelas, os Arcos da Lapa, Botafogo, e a Avenida Atlântica. No caminho, ainda ajudo uns turistas franceses. "Francês é foda", reclama um passageiro, "só sabe falar a língua dele e se recusa a aprender inglês, e ainda por cima fica puto quando tu vai ajudar! É foda!"

Desço na Bolívar. São umas 21h30, os bares estão cheios. Bem que Brasília podia ser assim, cerveja com gente bonita e despojada para todo o lado - pra lá da 1h da manhã. "Tem uns barzinhos novos por aqui... esse Espelunca tá com uma cara ótima!". Chego em casa. Aquele abraço na família, papai tá passando pra gente ir jantar.

Vamos a pé mesmo, tudo pertinho. No Espelunca mesmo. Comemos aquela costelinha na entrada, com um molho agridoce fantástico. Rola um sushi no prato principal. Meu pai e meu primo, pra completar, ainda atacam um carneirinho. Estou tranquila, só no choppinho. "Pô, bonzão esse lugar, hein!" finaliza satisfeito meu pai, pouco antes de pagar a conta, não tão boa assim.

No caminho de casa, um tropeço. Um menino, semi-despido, deitado sobre o ventilador de rua. Uma mistura de braços, pernas, mãos, e costelas.

Esta mesma noite minha tia, quando questionada sobre suas impressões iniciais da recente mudança para o Rio de Janeiro, prontamente responde: "Ah, é nojento, cara! Puta que o pariu! Cê sai de manhã e tropeça no moleque que dorme na frente do teu prédio, pô! Rua não é lugar de ninguém dormir não. Me embrulha o estômago, é muito pobre pra todo lado! Lá em Brasília é tudo camuflado, tudo limpinho."

O sushi, o avião, o choppinho... tudo começa a se revirar em meu estômago. Me dá um enjôo da vida; do despudorado exposto, do cruelmente camuflado. Meu pai me oferece seu casaco, não controlo o choro. Como poderia sentir frio enquanto o moleque dorme ao relento, encolhido na esperança de que, menor o corpo, menor o frio?

Lágrimas, náuseas. Uma tremida de indignação, perante apenas mais uma das injustiças do mundo. Meus companheiros, cadê? Na praia, afogando as mágoas nas ondas e na cerveja gelada. O Rio de Janeiro continua lindo. E nojento. É foda!

terça-feira, dezembro 02, 2008

Vivendo do lixo, no lixo

Um breve relato da vida de Dona Luzineide, catadora de lixo e moradora de rua em frente à UnB
*Com o apoio de Murilo Gomes e Pedro

Quem normalmente passa pelo final da via L3 Norte, já se acostumou com a paisagem constante que são os moradores de rua em frente à Colina, área residencial destinada aos professores da Universidade de Brasília (UnB). Carroças, barracos e moscas compõem o quadro nem sempre agradável de se ver, e são freqüentes as reportagens sobre o local. Dona Luzineide, catadora de lixo de 44 anos e aparência jovem, diz já estar "enjoada de tirar fotos".



As matérias na maioria das vezes enfatizam a venda de drogas e os maus-tratos com os cavalos. São superficiais e reforçam o estereótipo marginal dos moradores de rua. "Outro dia veio um menino saber se aqui vendia droga, e eu disse a ele: minha vida já é uma droga. A única droga que tem aqui sou eu", reclama a senhora ao varrer parte do papel que revende a uma empresa de reciclagem, pra debaixo de um plástico e "não molhar demais com a chuva".



Cearense, Luzineide nasceu em Missão Velha, mas não se lembra de nada da cidade natal. Foi muito nova para Juazeiro, na Bahia. De lá veio para Brasília e conheceu o marido, mineiro. “Agora moramos nós dois e uma de minhas filhas aqui, mais a menina dela. Moramos não, vivemos nesse lixo aí... mas lá era ainda pior, era muita miséria, a gente tinha uma roupa só pro ano inteiro. Aqui pelo menos as pessoas doam umas coisas de vez em quando."



Ainda assim, nem no lixo ela tem tranqüilidade. "Já me tiraram várias vezes daqui, mas eu sempre volto. Eles vêm, jogam todas as nossas coisas num caminhão, e vão embora." De acordo com Luzineide, nunca ofereceram uma outra moradia à sua família. Se dependesse dela, voltava para a Bahia, mas a família prefere ficar aqui. "Minha neta vai começar a estudar agora, quem sabe não consegue coisa melhor do que catar lixo numa carroça...", diz Luzineide, cética, porém com um quê de esperança.



Seu marido faz três viagens diárias, pelas comerciais do Plano Piloto, atrás de papel, papelão e comida. "O que der para aproveitar, nós aproveitamos. Não temos muita escolha."



Questionada sobre o decreto de 2007 que proíbe os catadores de transitarem com carroças, ela apenas prevê: "Qualquer dia vão querer proibir pobre até de andar, mas enquanto Deus me der pernas eu vou continuar andando". E segue varrendo o papel para debaixo do plástico. Inutilmente, pois a chuva a pingos grossos já chegou.