Desde o início, a idéia de “preguiça intelectual” me pareceu muito interessante. Ramón y Cajal utilizaram-na para explicar a necessidade de se estudar e estar disposto a trabalhar arduamente para sair do óbvio, do aparente esgotamento de idéias. A inspiração foi apresentada como um elemento extra, porém não suficiente para se obter bons resultados.
A meu ver, a “preguiça intelectual” vai além de uma preguiça em ler livros, escrever resenhas, apresentar seminários e estar sempre em dia com o plano de trabalho a se seguir para um determinado projeto. Ela está em não se dispor a pensar.
Julgo sempre mais cômodo – ainda que muito frustrante - aceitar seguir caminhos mais óbvios, já desbravados e livres de olhares tortos. Ir na direção contrária é sempre mais doloroso, e não apenas por razões externas, como preconceitos ou discordâncias. Ao contrário: o que mais pesa são os obstáculos interiores. É a preguiça de continuar pensando!
Na última reflexão eu trouxe um pouco da minha aflição de sempre estar pensando. Entretanto, ainda mais agonizante que o constante “estado pensante” é perceber que muitas são as vezes em que tenho de deixar de lado certas opiniões, complicações, dúvidas, indagações, empecilhos e pedras no caminho em prol de um consenso – que à noite, com a cabeça no travesseiro, percebo fajuto.
Explico: são cada vez mais constantes as abdicações de um debate aprofundado em busca de um suposto consenso, com a justificativa de que esse debate atravanca ações. Alguns defendem que quanto mais se sabe, menos se faz, pois alguns empecilhos colocados nunca seriam levantados por ignorantes stricto sensu.
Não defendo um debate por debate, mas muita ação não é sinônimo de bons resultados. Ações impensadas e espontâneas certamente podem dar certo. Muitas, contudo, são as que não dão – e isso poderia ser evitado com mais reflexão e debate acerca do assunto. O debate necessariamente deve conduzir a uma ação em um determinado momento. Essa ação, porém, deve ser precedida de uma discussão profunda. Uma vez trazida à tona a complexidade de cada questão, é provável que ela jamais se esgote, mas um mínimo de debate já seria suficiente para estimular reflexões até mesmo simultâneas à ação desenvolvida, que ainda que não fosse perfeita, seria no mínimo crítica.
Muitas vezes dou lugar à preguiça de debater e expor minhas idéias, construindo argumentos fortes e fundamentados... que serão, eventualmente, refutados. Curiosamente não é uma possível (e provável) refutação que me desestimula a seguir com o debate. São os olhares e discursos criticamente apáticos de quem repudia a constante discussão; não por ser favorecido pelo status quo, mas por deliberadamente não enxergar nenhum problema nele.
Deparada com essas resistentes barreiras, muitas vezes simplesmente desisto. Ainda mais difícil que dialogar com aqueles de idéias divergentes, é se relacionar com quem nem sequer idéias tem – e não está minimamente interessado em desenvolvê-las. Aí entra outra preguiça: a de mostrar à outra pessoa o quanto esse debate, essas idéias são necessários. Muitas vezes a pessoa não assimila isso, e eu ainda me sinto como se fosse uma catequizadora, encarregada de trazer a luz aos cegos de Platão! O conflito desloca-se então do debate sobre a ação para um debate sobre a necessidade de se debater, que atrasa ainda mais qualquer resultado almejado.
Essa idéia de detentora da verdade me incomoda, como coloquei na última reflexão. Contudo, não consigo pensar e agir de outra forma que não seja através de discussões e do debate de idéias. A partir dessas reflexões cheguei então a uma conclusão que vai me servir como ponto de partida. Minhas idéias certamente não são superiores às alheias, nem eu tenho as respostas do que é certo ou errado, melhor ou pior – se é que essas respostas existem - em mim mesma. Ainda assim, uma coisa é certa: fechar-se ao debate é uma postura equivocada. Então, por mais que eu tenha pré-concepções internas, estou aberta a confronta-las e, quem sabe, muda-las. Não estou certa, nem errada, apenas pensando. E aprendendo.
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